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Parque da Luz (área verde) está na lista de áreas que terão serviços oferecidos à iniciativa privada pela prefeitura.

Parque da Luz (área verde) está na lista de áreas que terão serviços oferecidos à iniciativa privada pela prefeitura. (Crédito: Prefeitura de São Paulo/Reprodução)

A Câmara de Vereadores de São Paulo aprovou, no dia 9 de maio, o Projeto de Lei 240/2017, que cria o Conselho Municipal de Desestatização, mais um passo na direção da montagem do arcabouço legal e administrativo para implementar uma das propostas centrais da campanha de João Doria ao cargo de prefeito, que consiste em vender bens públicos para a iniciativa privada ou estabelecer concessões e parcerias com ela para gerir equipamentos e serviços públicos. O Conselho será composto exclusivamente por secretários subordinados ao prefeito e, portanto, sob o comando de sua vontade. Não há no Conselho nenhuma representação da sociedade civil e, tampouco, qualquer mecanismo previsto de controle público e transparência.

O artigo “Vende-se o patrimônio da cidade de São Paulo… a portas fechadas” foi publicado originalmente no blog da professora e urbanista Raquel Rolnik — e faz parte da coluna “O Capital da Cidade” de Rolnik na Rádio USP.

O INCT Observatório das Metrópoles divulga o texto para debater os rumos das políticas públicas urbanas da maior cidade do país.

VENDE-SE O PATRIMÔNIO DA CIDADE… A PORTAS FECHADAS

POR RAQUEL ROLNIK

A Câmara de Vereadores de São Paulo aprovou na última terça-feira (9) o Projeto de Lei 240/2017, que cria o Conselho Municipal de Desestatização, mais um passo na direção da montagem do arcabouço legal e administrativo para implementar  uma das propostas centrais da campanha de João Doria ao cargo de prefeito,  que consiste em vender bens públicos para  a iniciativa  privada ou estabelecer concessões e parcerias com ela para gerir equipamentos e serviços públicos.

O Conselho tem a atribuição de decidir quais bens podem ser desestatizados e será composto exclusivamente por secretários subordinados ao prefeito e, portanto, sob o comando de sua vontade. Não há no Conselho nenhuma representação da sociedade civil e tampouco qualquer mecanismo previsto de controle público e transparência.

O PL, que ainda aguarda a sanção do executivo, apenas sugere a realização de audiências ou consultas públicas não vinculantes, isto é, as pessoas que se manifestarem, mesmo que se posicionem majoritariamente contra a proposta, não precisam  ter seus argumentos levados em consideração.

Na prática, a lei é um cheque em branco ao prefeito. A única brecha, inserida através de uma emenda durante o debate no legislativo, é que, depois de decididos os bens a serem desestatizados, a autorização de venda terá de passar pelos vereadores. Evidentemente passar pela Câmara é um avanço na medida em que exige pelo menos a publicização do que está sendo decidido. Entretanto, considerando como são armadas as coalizões e constituídas as bases de qualquer legislativo do país, e, particularmente na Câmara de São Paulo, onde o prefeito constituiu maioria, dificilmente os vereadores irão barrar as decisões tomadas pelo conselho.

A lei prevê ainda a criação de um Fundo Municipal de Desenvolvimento para onde vão os recursos provenientes da venda ou exploração comercial dos equipamentos e serviços. A lei estipula que esse fundo investirá prioritariamente em educação, habitação, saúde, transporte/mobilidade e segurança, prioridades de fato em São Paulo.  Mas há algumas pegadinhas aí. A primeira delas é que o texto fala em “prioritariamente” e não exclusivamente. E, em segundo lugar, porque a própria lei aprovada diz que a critério do conselho que, como já afirmei, é  composto exclusivamente pelo governo, o Fundo pode ser usado para cobrir qualquer tipo de despesa.

Parece-me que estamos embarcando em um processo com pouco controle social, transparência e debate, coisas absolutamente necessárias antes de se decidir sobre algo tão importante como o destino dos equipamentos e serviços públicos de São Paulo. Além disso, bens serão vendidos sem o devido debate em torno do interesse público para gastar em despesas que tampouco sabemos se são ou não prioritárias. No fim, a cidade vai ficar sem o bem público e sem o dinheiro.

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