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Um recente estudo canadense mapeou a concentração no ar das chamadas partículas finas. O pesquisador do Observatório e professor do Instituto de Geociências da Universidade de Brasília, Gustavo Baptista, em entrevista ao Correio Braziliense, aponta a necessidade do acompanhamento e monitoramento dessa forma de poluição.
Perigo invisível 
Pesquisadores canadenses conseguem mapear a concentração no ar das chamadas partículas finas. Essa forma de poluição é composta por resíduos microscópicos que, em excesso, podem causar danos à saúde, principalmente problemas respiratórios.
Tatiana SabadiniCada vez que o ser humano respira, por mais puro que o ar possa parecer, ele ingere milhares das chamadas partículas finas. Elas estão presentes em toda a atmosfera terrestre e, de tão pequenas, são invisíveis a olho nu. Passam a ser uma ameaça à saúde, levando principalmente a problemas respiratórios, quando sua concentração no ar passa de limites aceitáveis. Daí a importância de um estudo conduzido por cientistas canadenses que, pela primeira vez, conseguiram traçar um mapa global dessa forma de poluição e identificar as áreas com mais concentração das partículas finas, conhecidas pela sigla PM2.5. Segundo a pesquisa de Aaron Van Donkelaar e Randall Martin, da Universidade de Dalhousie, as áreas do planeta mais perigosas em termos de PM 2.5 são o Deserto do Saara e o leste da Ásia.

Cerca de 80% da população mundial respira ar com algum grau de poluição. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o nível ideal de partículas finas deve ter uma média anual de10µg/m³ (microgramas por metro cúbico). A ciência, no entanto, ainda não tinha informações sobre a concentração global de PM2.5. Mesmo com as ferramentas e os satélites disponíveis, era difícil medir a poluição do ar mais perto da superfície, justamente aquele inalado pelo homem. O feito dos canadenses foi justamente esse, publicado pela revista especializada Environmental Health Perspectives.

Inicialmente, Van Donkelaar e Martin combinaram as observações de dois satélites da agência espacial dos Estados Unidos, a Nasa. No entanto, os aparelhos não indicaram como a poluição era distribuída na atmosfera. “Nós usamos, então, um modelo de transporte químico, chamado de GEOS-Chem, para calcular a relação entre as amostras dos satélites e o PM2,5 na superfície”, explica Van Donkelaar ao Correio. O resultado é um mapa-múndi dividido em cores que indicam maior ou menor acúmulo das partículas em cada região (veja acima).

Políticas públicas
A dupla de cientistas acredita que a estimativa ilustrada no mapa da poluição, combinada com os estudos de impactos para a saúde, pode ajudar os governos a reconhecer as consequências da poluição do ar sobre a população. “Em regiões onde atividades humanas estão contribuindo significativamente para o crescimento do PM2.5, esse estudo pode ajudar a melhorar as emissões que podem ser uma ferramenta efetiva para ajudar na melhora da qualidade do ar e reduzir o número de doenças associadas às partículas”, afirma Martin.

Em regiões da China, eles apontam, a situação é crítica. As concentrações no leste do país chegam a 80µg/m³. A queima de combustíveis fósseis, decorrentes de atividades industriais, é a principal causa dessa realidade. A atividade industrial chinesa altera constantemente a qualidade do ar. Em casos assim, o risco à saúde é muito grande. “Se levarmos em conta que o diâmetro de um fio de cabelo é da ordem de 70µm (micrômetros), e os materiais particulados investigados são de 2,5µm a 10µm, eles podem facilmente se depositar em nosso aparelho respiratório. Normalmente, esses particulados são uma mistura complexa de partículas extremamente pequenas de sólidos dos mais diversos tipos com gotas de água. Monitorá-los e controlá-los é fundamental”, comenta Gustavo Macedo de Mello Baptista, professor do Instituto de Geociências da Universidade de Brasília e membro do Núcleo Brasília do Observatório das Metrópoles.

Uma das surpresas mostradas pelo mapa foram os altos níveis de PM2.5 em grande parte do Deserto do Saara, no norte da África. A poluição é um fenômeno causado pelo homem, mas a natureza também pode emitir grandes quantidades de partículas na atmosfera. “Elas podem vir de queimadas nas florestas ou, como é o caso do Saara, da poeira trazida pelo vento. O que ainda não está claro para a ciência é se todos os tipos de PM2.5 gerados naturalmente ou pelo homem têm os mesmos impactos para a saúde”, comenta Van Donkelaar.

No Brasil, a concentração de partículas está dentro do nível ideal. Há apenas algumas manchas na área de Mato Grosso e de Rondônia. Segundo o professor brasileiro, mesmo que o país não esteja na lista de risco, é preciso tomar medidas preventivas. “Não somos tão diferentes dos demais países que experimentaram tardiamente seu desenvolvimento industrial. E, nos grandes centros, encontramos fatores que acabam por incorporar na atmosfera os poluentes”, analisa Baptista.
Fonte: Correio Braziliense 16/11/2010