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Relatos e registros de atividades com a participação de integrantes do Núcleo Belém do INCT Observatório das Metrópoles integram a cobertura especial da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), realizada em Belém (PA), de 10 a 21 de novembro de 2025. Pesquisadores e bolsistas do núcleo participaram de diferentes atividades na Green Zone, que discutiram temas como moradia, gestão da água e resiliência urbana frente às mudanças climáticas, além dos impactos nas periferias urbanas.

Os relatos integram a Série Especial COP30, publicada pelo Observatório desde outubro com o objetivo de compartilhar reflexões sobre temas em pauta durante a conferência. Textos prévios sobre moradia, justiça climática, bioeconomia e transição ecológica também integram a série.

Foto: Tânia Rêgo (Agência Brasil).

A seguir, confira os relatos:

Moradia e justiça climática

A designer Bárbara Furtado, bolsista do Núcleo Belém, acompanhou o painel “Sem Moradia Digna não há Justiça Climática”, promovido pelo Habitat para a Humanidade Brasil. O debate abordou a relação entre a crise climática e a crise habitacional, destacando seus agravantes e possíveis soluções adaptadas a diferentes realidades.

O relatório apresentado pela organização, mediado por Raquel Ludermir, mostrou que a falta de moradia adequada é um dos principais fatores de vulnerabilidade climática, especialmente entre mulheres negras e mães solo, mais expostas à inadequação habitacional e à falta de saneamento.

O painel contou ainda com a participação de representantes do Instituto Pólis, União Nacional por Moradia Popular, MISEREOR e da Universidade das Nações Unidas (UNU), promovendo um diálogo internacional sobre justiça climática e direito à cidade. Foram destacados temas como o alto índice de doenças hídricas e arboviroses nas regiões metropolitanas e a importância da participação popular na formulação de políticas públicas.

Bárbara também registrou desafios estruturais do evento: “Muito foi feito para garantir o acesso seguro à Blue Zone, mas pouco à Green Zone, o que limita a participação da sociedade civil. Além disso, faltaram informações sobre a localização das atividades e abrigos adequados diante da chuva amazônica”. Por outro lado, ela destacou aspectos positivos, como o fornecimento gratuito de água, guarda-chuvas e a boa atuação da equipe de segurança.

Mulheres e gestão da água

O arquiteto e urbanista Walter Roberto da Silva Santos, pesquisador do Núcleo Belém, participou do painel “O papel central das mulheres na gestão da água: desafios e oportunidades para um futuro sustentável”, promovido pela Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) e pelo Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR).

O debate tratou da intersecção entre as ODS 5 (Igualdade de Gênero) e ODS 6 (Água e Saneamento), ressaltando que a desconexão entre essas metas tem impacto direto sobre comunidades rurais e ribeirinhas, onde mulheres lideram famílias sem acesso à água potável.

As falas destacaram ainda que apenas 25% dos países cumprem a dimensão de gênero das ODS, e que a agroecologia se apresenta como estratégia de resiliência hídrica e remoção de carbono. Foram enfatizados os valores simbólicos de “Mãe Terra” e “Irmã Água” e a defesa da água como bem público, conforme a Constituição Federal de 1988.

Representantes da ANA apresentaram dados sobre a desigualdade de gênero no acesso à água – em várias regiões, mulheres caminham até quatro horas diárias para coletá-la, e defenderam o empoderamento feminino na gestão das bacias hidrográficas, com capacitação continuada e maior presença nos comitês de bacia.

Renata Maranhão (centro) participa do debate O Papel Central das Mulheres na Gestão da Água em Belém (PA) – Foto: Filipe Marques / Banco de Imagens ANA.

A representante do Ministério das Mulheres encerrou o painel destacando que “as mulheres são como a água, porque juntas são mais fortes e criam os caminhos”, lembrando que elas estão 14 vezes mais propensas a sofrer com desastres climáticos e lideram a agroecologia e a proteção dos territórios.

Walter observou, contudo, dificuldades logísticas para o público local: “O acesso à Green Zone é limitado, com poucas linhas de ônibus e percursos longos e inseguros, o que restringe a participação de quem mora na Região Metropolitana de Belém”.

Cidades verdes e calor extremo

A arquiteta e urbanista Beatriz Barbosa do Nascimento, bolsista do Núcleo Belém, participou do diálogo “Cidades Verdes Resilientes: enfrentando o calor extremo”, realizado no Auditório Jandaíra, no Pavilhão Brasil.

O evento marcou o lançamento do Pacto pelas Cidades Verdes Resilientes, iniciativa federal criada pelo Decreto nº 12.041/2024, que convoca novos municípios a aderirem ao programa voltado ao aumento da qualidade ambiental e da resiliência urbana frente às mudanças do clima.

Mediado por Adalberto Maluf, Secretário Nacional de Meio Ambiente Urbano e Qualidade Ambiental, o diálogo reuniu representantes do MMA, MCidades, MCTI e da sociedade civil. Maluf destacou que “os dois mil municípios mais carentes e vulneráveis do país são exatamente os que têm menor capacidade adaptativa e menos condições de se financiar”.

Também foi divulgado o Guia de Boas Práticas para Cidades Amazônicas, reforçando a necessidade de integração intermunicipal e da participação comunitária nas políticas urbanas e climáticas.

Adaptação Climática e Periferias Urbanas

Já no segundo dia de evento (11 de novembro), o debate sobre justiça climática e direito à cidade seguiu com o painel “Adaptação Climática e Periferias Urbanas”, realizado no Fórum Landi como parte do Circuito Foco na COP30. A atividade foi coordenada por Roberta Rodriguez, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFPA e do INCT Observatório das Metrópoles Núcleo Belém, com participação de Inêz Medeiros, da Biblioteca Comunitária Itinerante da Vila da Barca, Natasha Reis, da ONG Mandí, além de Monique Bentes Machado e Juliano Ximenes, respectivamente pesquisadora e coordenador do Núcleo Belém.

A pedagoga Inêz Medeiros abriu o debate trazendo o exemplo da Vila da Barca, comunidade ribeirinha centenária, como símbolo da resistência frente à pressão imobiliária e às intervenções urbanas promovidas no contexto da COP30. Ela destacou a “seletividade dos modos de vida que merecem infraestrutura”, apontando a desigualdade entre obras concentradas na orla e a falta de investimento nas áreas populares. A comunidade teme que a verticalização da orla resulte em remoções forçadas, e denuncia o envio de esgoto de empreendimentos de alto padrão para a região.

A educadora Natasha Reis relatou as ações da ONG Mandí, que atua em periferias urbanas a partir do debate sobre rios e justiça ambiental. Segundo ela, “as periferias vivem na linha de frente da crise hídrica”, com Belém entre os piores índices de saneamento do país. A organização desenvolve pesquisa sobre água, saneamento e clima e integra a Rede Jandyras, com foco no fortalecimento político das mulheres periféricas.

A professora Monique Bentes analisou o atual ciclo de remoções e reassentamentos na Região Metropolitana de Belém, destacando que as intervenções associadas à COP30 seguem a lógica de grandes eventos urbanos, concentrando investimentos nas áreas centrais. Citando dados do IBGE (2022), ela mostrou que a capital paraense enfrenta forte pressão imobiliária – o aluguel no bairro Reduto aumentou 67% em um ano – e alertou para o risco de gentrificação e expulsão das populações ribeirinhas.

Encerrando o painel, Juliano Ximenes apresentou dados do IBGE (2022) sobre favelização e saneamento, revelando que 56% dos domicílios da Região Metropolitana de Belém estão em assentamentos precários. Ele destacou a vulnerabilidade ambiental da região, onde 74% da superfície territorial está suscetível a inundações, alagamentos e erosões, e defendeu a urbanização de favelas como prioridade em políticas habitacionais e climáticas.

A professora Olga Freitas fez um comentário final sobre os impactos e o legado das obras urbanas, observando que o Canal da Tamandaré vem sendo apropriado pela população, mas sem manutenção adequada, o que evidencia a fragilidade das intervenções públicas após a inauguração.

A bolsista do Núcleo Belém Bárbara Furtado, que acompanhou a atividade, ressaltou as contradições entre as áreas beneficiadas pelas obras da COP30 e as comunidades periféricas: “Enquanto se requalificam avenidas já estruturadas, como a Júlio César, as áreas populares seguem sem investimento ou sofrem remoções e processos de gentrificação”.

Próximas atividades

A COP30 ocorrerá até o dia 21 de novembro de 2025. Até lá, pesquisadores da rede do Observatório das Metrópoles seguem participando de diversas atividades. Entre elas, destacamos:

No dia 12 de novembro, às 12h30, no Auditório Uruçu da Green Zone, o pesquisador José Júlio Ferreira Lima (UFPA) participa do painel sobre o projeto “Defensoria Pública e Justiça Climática: cooperação institucional pelo combate ao desmatamento e proteção da biodiversidade no campo e defesa das comunidades urbanas vulnerabilizadas frente às mudanças climáticas“. Além de José Júlio, participam do painel os defensores públicos do Estado do Pará, José Adaumir Arruda da Silva, Arthur Correa da Silva Neto e Luciana Albuquerque Lima, junto com Paulo Amaral (IMAZON) e Myrian Silvana Cardoso Ataíde (UFPA).

Já no dia 17 de novembro, às 14h, no Pavilhão Caixa da Green Zone, ocorre o painel sobre o “Projeto AdaptaAÇÃO: promovendo o planejamento dos municípios sob a perspectiva climática“. Na ocasião, haverá a divulgação do resultado do Edital de Seleção Pública dos 50 municípios ou consórcios públicos interessados em aprimorar seus instrumentos de política urbana frente aos desafios das mudanças climáticas.

O Projeto AdaptAÇÃO é uma iniciativa conjunta do Ministério das Cidades e da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), por meio do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (IPPUR) e do INCT Observatório das Metrópoles. Durante o painel, estarão presentes Yuri Rafael Della Giustina (MCidades), Karla Christina França (CNM), Henrique Evers (WRI) e Juliano Ximenes (UFPA), coordenador do Núcleo Belém.