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No ano de 2022, a desigualdade da renda do trabalho nas metrópoles brasileiras teve aumento por três trimestres consecutivos. É o que indica a 12ª edição do “Boletim Desigualdade nas Metrópoles”, produzido em parceria pelo PUCRS Data Social, o Observatório das Metrópoles e a Rede de Observatórios da Dívida Social na América Latina (RedODSAL). A novidade neste boletim é que, ao mesmo tempo que tem ocorrido o aumento da média de rendimento das pessoas no mercado de trabalho, para todos os segmentos de renda, tem aumentado também as desigualdades. “Isso significa que a distância entre os diferentes grupos sociais tem aumentado ao longo de 2022, principalmente capturada nesse último trimestre”, pontua o pesquisador do Observatório das Metrópoles, professor do IPPUR/UFRJ e um dos coordenadores do estudo, Marcelo Ribeiro.

Os dados referentes ao último trimestre de 2022, liberados recentemente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), consolidam uma tendência que já vinha sendo observada nas regiões metropolitanas brasileiras: recuperação da renda do trabalho das famílias combinada a uma inclinação de piora da desigualdade. Entre o primeiro e o último trimestres de 2022, a média da renda domiciliar per capita do trabalho subiu 13%, indo de R$1.455 para R$1.644. Ao mesmo tempo, a desigualdade de renda, medida pelo coeficiente de Gini – quanto mais alto, maior a desigualdade – subiu de 0,613 para 0,620, com três altas consecutivas. A principal explicação para esse resultado, indicam os dados, se encontra no fato de que os mais ricos têm se aproveitado mais do crescimento da renda que os mais pobres.

O grupo de menor renda é aquele mais desprotegido no mercado de trabalho, porque, normalmente, as taxas de informalidade se concentram mais sobre esse segmento da população. Isso significa que mesmo com a ocorrência da situação de aumento de renda, as garantias necessárias para as pessoas estarem no mercado de trabalho não estão completamente asseguradas. “É um grupo bastante vulnerável, inclusive por esta característica. Durante a pandemia foi o grupo que mais sofreu de forma imediata. Perdeu renda, por conta do tipo de vínculo que possui com o mercado de trabalho, mas, também, foi o grupo que primeiro voltou ao mercado de trabalho e isso possibilitou o aumento de renda, mas um aumento que tem sido com o crescimento cada vez menor”, ressalta Ribeiro.

Ou seja, os mais pobres, como tem uma vinculação mais vulnerável no mercado de trabalho, inclusive com relações informais, dependem muito da própria dinâmica econômica, que tem a ver com as atividades que realizam. Diferentemente dos segmentos mais altos, que estão mais protegidos no mercado de trabalho e tem maior capacidade de negociação com seus patrões de ampliar o nível de renda, e que não dependem exatamente do desempenho da atividade econômica em geral. “Se não houver uma retomada de crescimento maior na economia, a tendência seria de um aumento ainda maior da desigualdade de renda entre esses segmentos”, explica Ribeiro.

Metrópoles têm comportamentos diferentes

Embora cada metrópole apresente comportamentos diferentes, na maior parte delas (12 dentre as 22) se verificou aquele mesmo comportamento de crescimento das desigualdades. Na grande São Paulo, por exemplo, o Gini aumentou de 0,600 para 0,614, e na Grande São Luís subiu de 0,558 para 0,615. Concomitantemente, em todas as vinte e duas metrópoles foi também constatado aumento da média de renda. Esse aumento foi mais elevado nas Regiões Metropolitanas da Grande São Luís (36,6%), João Pessoa (34,4%), Teresina (29,3%), Goiânia (22,6%) e Vale do Rio Cuiabá (19,0%).

Segundo o pesquisador do PUCRS Data Social e, também, coordenador do estudo, Andre Salata, a combinação de aumento da média de renda e comportamento de elevação das desigualdades não é incomum no Brasil. “Isso ocorreu porque os estratos mais altos apresentaram, nos últimos trimestres, um aumento proporcionalmente maior de seus rendimentos do que os mais pobres”, aponta. De fato, o estudo mostra que enquanto a média de renda dos 40% mais pobres cresceu 13,4% ao longo de 2022, entre os 10% mais ricos ela cresceu 17,3%. Consequentemente, se no início do ano os mais ricos ganhavam, em média, 30,2 vezes mais que os mais pobres, essa cifra chegou a 31,2 vezes no final do ano. Ou seja, todos os estratos melhoraram, mas os mais ricos melhoraram proporcionalmente mais, fazendo a distância entre eles e os mais pobres aumentar ao longo do último ano.

Explicação para o aumento da renda média pode ser decorrente de dois fatores

“Em 2022, se verificou redução da taxa de desemprego, colaborando para a ampliação do aumento da renda nos domicílios. Além disso, a taxa de inflação desacelerou a partir dos meses de maio e junho, contribuindo para a manutenção do poder de compra dos rendimentos do trabalho. Aumento do emprego e redução da taxa de inflação são os dois fatores que, conjugados, contribuíram para a elevação da renda média de todos os estratos de rendimento das metrópoles brasileiras”, avalia Ribeiro. Como o estrato dos 10% mais ricos foi o que mais se beneficiou do efeito desses fatores, a desigualdade de renda se elevou, na medida em que ocorreu aumento da distância do nível de renda dos mais ricos em relação aos demais estratos de rendimento. Os mais ricos saltaram de um rendimento médio de R$6.765 para R$7.933, entre o primeiro e o último trimestre de 2022.

Enquanto isso, a recuperação da renda do trabalho entre as famílias mais pobres, que vinha se desenhando desde o terceiro trimestre de 2020 – após brusca queda no início da pandemia –, perde um pouco de seu ímpeto a partir do segundo trimestre de 2022. De acordo com Salata, a recuperação do mercado de trabalho foi suficiente para trazer a média de renda dos mais pobres para o patamar que havia no momento imediatamente anterior à pandemia. “No entanto, hoje essa média ainda é 22% menor que aquela encontrada no pico da série histórica, ao final de 2013. Ou seja, avançamos em relação ao tombo dos últimos anos, mas ainda falta muito para nos aproximarmos dos maiores valores da série histórica”, analisa. Para isso, segundo Salata, seria necessário aliar crescimento econômico com melhora da distribuição de renda.

Os dados da décima segunda edição do boletim são provenientes da PNAD Contínua trimestral, do IBGE, e dizem respeito à renda domiciliar per capita do trabalho, incluindo o setor informal. O recorte utilizado é o das 22 principais áreas metropolitanas do país, de acordo com as definições do IBGE. Todos os dados estão deflacionados para o terceiro trimestre de 2022, de acordo com o IPCA.

Confira na íntegra o “Boletim Desigualdade nas Metrópoles nº 12”.

Acesse aqui as tabelas e gráficos do estudo.