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Por Renato Pequeno*

Fortaleza, quarto município brasileiro em população e maior produto interno bruto do Nordeste, atravessa mais um processo de revisão do seu Plano Diretor. Iniciado em 2019, mais uma vez podem ser constatadas contradições na sua realização, prevalecendo a lógica da apropriação da cidade pelos grupos hegemônicos, em total consonância com o poder local.

Vencida a tentativa de apresentação de um projeto de lei elaborado internamente pela Secretaria de Urbanismo e Meio Ambiente em 2019, a Prefeitura recuou e estabeleceu um processo participativo, instaurando núcleo gestor, reunindo representantes de diferentes setores da cidade. Em seguida, promoveu a contratação da Consultoria Quanta/Gênesis, que desde 23 de janeiro de 2023 passou a realizar atividades abertas ao debate, compilando leituras comunitárias e setoriais, bem como proposições oriundas de diversos âmbitos.

Destaque para as propostas formuladas pelo “campo popular” as quais trazem em seus conteúdos encaminhamentos para enfrentar questões recorrentes na política urbana local: os impedimentos ao controle social da política urbana, evidenciando a ausência de um conselho municipal de desenvolvimento urbano cidade; o combate às tentativas de remoção de comunidades, mediante o aumento da demarcação de favelas como zonas especiais de interesse social; incremento das Zeis vazios de modo a garantir a democratização do acesso à terra urbanizada favorecendo o reassentamento e a provisão habitacional de interesse social em vazios urbanos.

O processo avança e desde outubro passaram a ser definidos os delegados que representarão os mais diversos setores, mesmo antes da apresentação dos últimos produtos pela consultoria e pelos setores da prefeitura diretamente envolvidos. Neste sentido, foi realizado o curso “Fortaleza em disputa: direito à cidade e política urbana” numa parceria entre o Quintau Coletivo e o Laboratório de Estudos da Habitação (LEHAB/UFC), sob a coordenação de Renato Pequeno, integrante do Núcleo Fortaleza do INCT Observatório das Metrópoles. Além do Observatório, a iniciativa contou com o apoio do Fórum Nacional da Reforma Urbana, do Habitat para a Humanidade Brasil, do Centro de Direitos Econômicos e Sociais (CDES) e da União Européia.

Participantes do curso “Fortaleza em disputa: direito à cidade e política urbana”.

Dentre os objetivos desta formação, destacamos: fortalecer a atuação dos movimentos sociais e ativistas urbanos nos territórios de Fortaleza; contribuir na preparação para os debates em espaços de discussão sobre o Plano Diretor de Fortaleza, inclusive na imprensa local; proporcionar uma melhor apropriação das propostas da sociedade civil voltadas para garantir uma cidade socialmente justa, contrariando os interesses dos grupos hegemônicos e combatendo as históricas disparidades sociais.

Este curso de extensão se deu no Departamento de Arquitetura, Urbanismo e Design da UFC através de 14 aulas e uma reunião geral do campo popular, subdividas em três módulos:

  1. Direito à cidade, produção capitalista do espaço urbano e os objetivos do desenvolvimento sustentável;
  2. Políticas urbanas e habitacionais;
  3. Incidência no Plano Diretor.

Realizado por meio de aulas em que os diversos temas foram debatidos, este processo de capacitação contou ainda com aula pública de abertura e aulas de campo.

Participaram deste espaço formativo 37 pessoas inscritas e 7 ouvintes, grupo composto por delegados representantes do campo popular nas futuras conferências do plano diretor, integrantes dos movimentos sociais de moradia, integrantes e ativistas de movimentos ambientais de assessorias técnicas populares e grupos de extensão da UFC diretamente envolvidos com o direito à cidade. Ao final deste processo, espera-se como resultado a elaboração de uma cartilha informativa, que objetiva trazer conceitos centrais e as principais propostas do campo popular para a Conferência da Cidade, e de artigos de opinião pelos participantes, trazendo uma leitura crítica do processo que tem ocorrido em Fortaleza, e reforçando as propostas elaboradas pelo campo popular.

O curso se encerrou no dia 05 de dezembro, mas a luta pelo direito à cidade prossegue. Diante dos novos produtos apresentados pela Secretaria de Urbanismo e Meio Ambiente e pela consultoria contratada, novos debates deverão ocorrer. Como 2024 ocorrerão eleições municipais, muitos interesses estarão em jogo!


* Renato Pequeno é Professor Titular do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Ceará e coordenador do Laboratório de Estudos da Habitação (LEHAB). Integra o Comitê Gestor do INCT Observatório das Metrópoles e é pesquisador do Núcleo Fortaleza.