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É com profundo pesar e imensa gratidão que a comunidade acadêmica e o Observatório das Metrópoles se despedem da Professora Fany Davidovich. Partiu uma das mais brilhantes geógrafas de sua geração, uma pensadora cuja obra foi fundamental para a consolidação da Geografia Urbana crítica no Brasil e cuja liderança foi um pilar na criação e consolidação de um dos mais importantes centros de estudos urbanos do país.

Fany Davidovich foi uma intelectual rara, que soube articular com maestria o rigor da análise econômico-espacial com uma visão profundamente humana e crítica da cidade. Suas contribuições para a Geografia Urbana são indeléveis. Ela foi pioneira em investigar criticamente as complexas relações entre competitividade urbana, globalização e território, demonstrando como as grandes transformações da economia mundial se materializavam de forma assimétrica e conflituosa no espaço das metrópoles brasileiras.

Sua pesquisa, sempre ancorada em dados sólidos e uma fina percepção teórica, iluminou temas cruciais como finanças públicas urbanas, redes de cidades e a reestruturação do papel do Estado no planejamento territorial. Fany não se limitava a descrever as desigualdades; ela as desvendava, mostrando os mecanismos econômicos e políticos que as produziam e reproduziam. Seus escritos tornaram-se referência obrigatória, formando gerações de geógrafos e urbanistas que aprenderam com ela a ver a cidade em sua totalidade e complexidade.

Paralelamente à sua trajetória acadêmica seminal, seu legado institucional é igualmente monumental. Fany Davidovich foi uma das arquitetas intelectuais do Observatório das Metrópoles. Foi na sua capacidade de enxergar a necessidade de um projeto coletivo, interinstitucional e de longo prazo para decifrar as metrópoles nacionais, que o Observatório encontrou um de seus alicerces mais sólidos. Ela concebeu e liderou algumas das investigações mais importantes da rede, sempre insistindo na indissociabilidade entre a produção de conhecimento rigoroso e seu compromisso com a transformação social.

No Observatório, sua voz era sinônimo de profundidade analítica e integridade intelectual. Era uma mentora generosa, que inspirava colegas e orientandos não apenas pelo seu vasto conhecimento, mas por sua ética inquebrantável e sua crença no poder emancipador da pesquisa. Sob sua influência, a instituição aprendeu a equilibrar a crítica contundente com a construção de alternativas, tornando-se um farol no debate sobre o futuro das nossas cidades.

O vazio deixado por sua partida é imensurável. No entanto, sua herança dual permanece mais viva do que nunca: avançou as fronteiras da Geografia Urbana e forjou uma instituição dedicada a colocar esse conhecimento a serviço da sociedade.

Fany Davidovich segue presente em cada artigo que citamos, em cada projeto que desenvolvemos e na busca incansável por cidades mais justas e democráticas que continua a guiar o nosso trabalho.

À sua família, amigos e a todos que foram tocados por sua inteligência e humanidade, estendemos nossas mais sinceras condolências.

Fany Davidovich (segunda da direita para a esquerda) no 3º Congresso Brasileiro de Geógrafos – julho de 1974 – Belém/PA. Foto: Acervo pessoal de Pedro Geiger.