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Produzir Casas ou Construir Cidades? Desafios para um novo Brasil urbano

O Laboratório de Habitação e Assentamentos Humanos (LABHAB/USP) lança o livro “Produzir casas ou construir cidade? Desafios para um novo Brasil Urbano”, coordenado pelo professor João Sette Whitaker Ferreira, e disponível para leitura online ou para download.

A seguir a Apresentação do livro “Produzir casas ou construir cidade? Desafios para um novo Brasil Urbano”, João Sette Whitaker.

Criado em novembro de 1996 no Departamento de Projeto da FAUUSP, o Laboratório de Habitação e Assentamentos Humanos (LABHAB/USP) iniciou suas atividades em março de 1997, com a intenção de interligar as atividades de ensino, pesquisa e extensão universitária em um mesmo espaço, dando prioridade à formulação de alternativas para as demandas habitacionais, urbanas e ambientais que visem a inclusão social. Assim, os trabalhos que desenvolve – planos, projetos e assessoria a Municípios, ONGs e comunidade, têm sempre um caráter experimental, constituindo-se em processo de formação e capacitação para análise crítica e ação propositiva.

 

APRESENTAÇÃO

A pesquisa que embasou a elaboração desta publicação foi iniciada em 2010 e partiu de uma inquietação: no bojo de um ciclo de crescimento econômico nacional bastante sólido, que implica uma intensa atividade da construção civil na área habitacional, estão sendo construídos nas nossas cidades prédios e mais prédios, sem qualquer critério. Novos bairros crescem Brasil afora em meio a uma espécie de euforia construtiva, mas não parece haver o cuidado necessário com a qualidade urbana resultante, a injustiça social que nossas cidades produzem, tampouco os impactos desse crescimento sobre o meio ambiente. Em outras palavras, o que nos preocupava era o seguinte: que tipo de cidades estamos construindo para as gerações futuras?

Embora o aquecimento da construção civil ocorra também no mercado de alto-padrão, sempre o preferido dessa atividade, e na produção pública de habitação social, destinada às faixas de renda mais baixa, a radiografia do fenômeno mostra que ele se dá sobretudo na produção para a classe média, no chamado “segmento econômico”.

A eliminação, a partir de 2006, de alguns gargalos administrativos e institucionais, dando maior segurança jurídica e financeira ao setor da construção, e levando a significativo aumento do crédito imobiliário, associada ao crescimento da economia nacional, deu oportunidade de acesso ao financiamento habitacional a uma parcela da população antes alijada dessa possibilidade, aquecendo de forma inédita a oferta de moradia para as camadas de renda intermediária. Some-se a isso o lançamento, em 2009, do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), com o objetivo de enfrentar a crise econômica justamente por meio da dinamização da atividade da construção civil.

Porém, esse significativo impulso da construção ocorre de forma preocupante: em todo o país, novos bairros surgem em áreas distantes e sem urbanização, alinhando centenas de casas idênticas e minúsculas, ou enfileirando torres habitacionais com sofrível padrão construtivo, e grande impacto sobre o meio ambiente. Em face disto, a pergunta que nos vem naturalmente é: quais os resultados que essa produção provocará no cenário urbano brasileiro nos próximos anos?

Estaríamos promovendo uma urbanização adequada para que as próximas gerações usufruam de uma boa qualidade de vida, qualquer que seja sua classe social? O LabHab-FAUUSP trabalha com mais frequência a questão da moradia social e dos assentamentos precários de baixa renda, embora se preocupasse há algum tempo também com a faixa de mercado do “segmento econômico”, tendo inclusive promovido, ainda em 19971 , um seminário sobre a questão. O desafio era tão instigante que resolvemos retomar esse tema e tentar de alguma maneira contribuir para seu entendimento.

A melhor forma de fazê-lo, no âmbito das nossas competências acadêmicas e de pesquisa, foi empenharmonos na elaboração deste livro. Uma publicação que expusesse uma ampla pesquisa levantando pelo País afora a produção imobiliária do segmento econômico, fosse ela no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida ou não. O que nos preocupava era analisar, ilustrando com imagens, a produção do mercado, a partir de pesquisa sobre as incorporadoras, construtoras e vendedoras atuantes neste segmento, apontando os principais problemas que, a nosso ver, vêm caracterizando a produção do setor, salvo raras exceções.

Queríamos, a partir disso, identificar as limitações e impactos possíveis para as cidades, bairros e moradores e então apresentar aos leitores os parâmetros do que poderíamos chamar de uma “boa urbanização”, assim como, por outro lado, mostrar alternativas reais de projetos arquitetônicos e urbanísticos de melhor qualidade

A pesquisa resultou então no presente livro, realizado com o apoio da Fundação para a Pesquisa em Arquitetura e Ambiente – FUPAM.

No Capítulo 1 – Que cidade queremos para as gerações futuras? O trágico quadro urbano no Brasil do século XXI: cidades cindidas, desiguais e insustentáveis, discute-se o problemático e injusto modelo urbano brasileiro, e a necessidade premente de mudança de paradigmas para a construção de cidades mais justas e democráticas. A partir da constatação da ausência dos arquitetos como agentes de decisão nos atuais processos de produção habitacional, reflete-se também nesse capítulo sobre o que seria entendido como “boa arquitetura” que, por sua vez, não existe sem “boa urbanização”.

No Capítulo 2 – Segmento Econômico e o Programa Minha Casa Minha Vida: regras do jogo, agentes envolvidos e impactos decorrentes, analisa-se o Programa Federal Minha Casa Minha Vida, que responde por parte importante da atual produção voltada ao “segmento econômico”. A verdade é que o aquecimento desse mercado iniciou-se antes do programa, e certamente continuará, atrelado ou não a ele. Ainda assim, é indiscutível também que, desde 2009, o PMCMV tornou-se a locomotiva da produção habitacional do País, em inédito esforço de enfrentar a questão da moradia.

Por isso, e até mesmo como contribuição, este livro não poderia deixar de analisá-lo, mais especificamente na sua vertente voltada justamente para as camadas de renda até dez salários mínimos, que constituem o perfil do segmento econômico. Assim, são destacados nesse capítulo os principais elementos a respeito do programa e abordadas responsabilidades, atribuições e limitações das atuações de cada um dos agentes envolvidos.

Em seguida o livro radiografa a produção do “segmento econômico”, evidenciando seus desastrosos resultados. Para isso, no Capítulo 3 – Retrato da atual produção do “segmento econômico” e parâmetros de qualidade urbanística e arquitetônica, são elencados parâmetros de qualidade urbanística e arquitetônica, que possibilitam analisar a atual produção do segmento econômico e vislumbrar alternativas de boas soluções para os projetos em curso. Analisam-se os empreendimentos habitacionais a partir de questões técnicas, evidenciando os problemas existentes, e indicando os parâmetros a respeitar para alcançar melhores resultados.

À luz desses parâmetros, e também para ilustrá-los, são apresentados bons exemplos de projetos habitacionais, referências nacionais e internacionais, em seus aspectos urbanísticos e arquitetônicos. Mas se há na história da arquitetura referências interessantes de bons empreendimentos habitacionais, interessava-nos mostrar que isso também é possível dentro das condicionantes atuais que norteiam a produção habitacional brasileira.

Por isso, no Capítulo 4 – Proposições Arquitetônicas e Urbanísticas para três empreendimentos do “segmento econômico” – propusemos a três escritórios de arquitetura com renomada experiência na área habitacional, que projetassem soluções arquitetônicas e urbanísticas para três empreendimentos hipotéticos, com condicionantes semelhantes ao do segmento econômico. Os projetos apresentados pelos escritórios Arquiteto Hector Vigliecca e Associados, Piratininga Arquitetos Assossiados e Peabiru Trabalhos Comunitários e Ambientais, evidenciam que o quadro crítico anteriormente comentado teria outros horizontes possíveis, mais promissores para as nossas cidades. A ideia das simulações e proposições é equacionar aspectos emblemáticos da produção atual que impactam negativamente o desenvolvimento habitacional e urbano, revelando melhores soluções. Fomos também movidos por outra curiosidade: como um escritório de arquitetura, também de renome, mas estrangeiro, imerso na realidade européia e longe dos constrangimentos de custos, legais ou de toda ordem que afetam os projetos por aqui, responderia ao mesmo desafio.

Por isso convidamos o escritório belgonorueguês JDS Architects a dar resposta conceitual a uma das situações hipotéticas sugeridas. Por fim, para o caso das três primeiras propostas, a análise dos custos desses projetos, feita sob a consultoria do arquiteto Khaled Goubar, professor titular da FAUUSP e especialista no tema, permitiu verificar a viabilidade dos projetos apresentados.

A partir do ponto de vista de um laboratório de pesquisa habitacional inserido em uma universidade pública, este livro retrata uma preocupação cidadã: a do futuro das nossas cidades. Esperamos que tenham boa leitura!

 

Faça o download do livro “Produzir casas ou construir cidade? Desafios para um novo Brasil Urbano” no site do LAH-HAB/USP.