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Relator acompanha denúncias de violação do direito à moradia no Rio de Janeiro

By 15/06/2011janeiro 29th, 2018Notícias

Nos dias 18, 19 e 20 de maio, o relator Nacional do Direito à Cidade da Plataforma Dhesca Brasil, Orlando Júnior, professor do IPPUR/UFRJ, esteve em missão oficial no Rio de Janeiro para acompanhar as denúncias de violação do direito à moradia devido às remoções realizadas em função da preparação da cidade para a Copa do Mundo de 2014 e para as Olimpíadas de 2016. Segundo o relator, as nove comunidades visitadas denunciaram a falta de transparência por parte do poder público e a truculência das ações envolvendo remoções.

A missão, que contou com a participação da relatora da ONU para o Direito à Moradia Adequada, Raquel Rolnik, irá gerar um relatório oficial sobre as visitas, com recomendações aos órgãos responsáveis sobre cada comunidade. Segundo Orlando Júnior, o Rio de Janeiro precisa superar inúmeros desafios no que tange aos interesses da iniciativa privada, poder público e comunidades para a realização dos megaeventos em 2014 e 2016, sendo que a população da cidade deve ser respeitada em seus direitos. No contexto da moradia, as soluções devem passar pela garantia de opções para os moradores que estão sendo desalojados. “O melhor caminho inclui indenização justa, englobando o valor do solo urbano independente da situação fundiária, e opção de reassentamento na mesma área. Estas medidas servem para garantir a manutenção dos laços culturais e comunitários, bem como a inserção no mercado de trabalho já estabelecidos pelos moradores”, defende.

O relator aponta ainda a necessidade de divulgação dos projetos, a realização de audiências com as comunidades envolvidas e a imediata suspensão dos despejos previstos. Além disso, a Relatoria pede a constituição de um espaço institucional de mediação de conflitos no município do Rio de Janeiro.

Para Raquel Rolnik, a primeira violação que se tem cometido no Brasil quando o assunto é moradia é a do direito à informação. “As comunidades diretamente atingidas, quando recebem alguma informação, recebem de maneira incompleta. As negociações são feitas pessoa a pessoa, família a família, dividindo a comunidade, muitas vezes por meio de ameaças e pressões”, afirma.

Plataforma Dhesca

A “Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais” (Plataforma Dhesca Brasil) é uma articulação nacional de 34 movimentos e organizações da sociedade civil, em torno do desenvolvimento de ações de promoção, defesa e reparação dos direitos humanos, visando o fortalecimento da cidadania.

Uma das principais atividades que a Plataforma desenvolve são as Relatorias de Direitos Humanos, entre as quais se situa a Relatoria do Direito Humano à Cidade. O Projeto Relatores vem atuando sistematicamente na luta em defesa dos Direitos Humanos e constitui-se num instrumento de exigibilidade e justiça da sociedade civil brasileira em cumprimento à Constituição Federal e aos pactos assinados pelo governo brasileiro.

As Relatorias têm como objetivo desenvolver no Brasil uma cultura de reconhecimento e respeito ao direito à cidade. Do ponto de vista formal, pode-se afirmar que o Brasil conta com um elenco de leis extremamente avançadas e favoráveis aos direitos humanos, no entanto a população de baixa renda continua desprotegida de seus direitos e, em especial, o direito humano à moradia – Direito Constitucional. O Estado por meio de execução de políticas públicas inclusivas deve coibir as violações do direito à cidade e garantir ações políticas de promoção e proteção deste direito.

Violação do Direito à Moradia Digna

A missão oficial da Plataforma Dhesca Brasil visitou nove comunidades no Rio de Janeiro: Favela do Metrô Mangueira, Campinho, Vila Harmonia, Vila Autódromo, Restinga, Recreio II, Estradinhas, Providência e Sambódromo. Segundo o Relator do Direito à Cidade, Orlando Júnior, o que se constatou nestes locais foi a falta de clareza por parte do poder público junto às comunidades, além da violação do direito à moradia digna. “O que mais me chama atenção é o fato de a Prefeitura não reconhecer e indenizar a posse dos moradores, independente da situação fundiária existente, contrariando a Constituição Federal e o Estatuto das Cidades. Como consequência, os moradores que residem em áreas irregulares só recebem a indenização relativa às benfeitorias (o seu imóvel construído), sem considerar o valor do solo urbano onde os mesmos estão situados, o que é insuficiente para adquirir um imóvel na área em que residem”, explica.

Em Campinho, zona Norte do Rio, por exemplo, a previsão da Prefeitura era remover 75 famílias, sob a alegação da construção da TRANSOESTE. A primeira proposta do poder público foi de reassentamento das famílias para as moradias do programa Minha Casa, Minha Vida em Cosmos. Porém, a comunidade considerou o local muito distante e recusou a proposta. Por sua vez, o poder público ofereceu indenizações, mas os valores apresentados pela Prefeitura foram muito baixos, inviabilizando a compra de outro imóvel na localidade. É o que relata o morador Jessé Gomes, pai de quatro filhos, e que teve sua casa avaliada inicialmente em R$ 12 mil. Ele explica que sobre esse valor foi acrescido 40% referente à compra assistida, e depois a Prefeitura resolveu estabelecer um valor único de R$ 37 mil para residências e de R$ 20 mil para o comércio, independente do tamanho e da qualidade dos imóveis. Segundo ainda o relato dos moradores, a maior parte das famílias que foi removida ainda não recebeu indenização.

Já em Vila Harmonia, na zona Oeste, foram derrubadas 120 casas. De acordo com os relatos da comunidade, a remoção foi feita sem a apresentação do projeto e sem uma justificativa para os moradores. A maioria das famílias foi realocada para o condomínio da Estrada dos Caboclos, em Campo Grande; porém há casos de moradores que foram expulsos do local pela milícia que controla a área.

Para a Relatora Especial da ONU, Raquel Rolnik, existe uma série de normas que devem ser seguidas visando a garantia do direito à moradia adequada. “No caso de remoção, independente se é próprio, alugado ou cedido – não importa a condição da propriedade – a população tem que ter tempo para se defender e participar da solução; não se pode fazer remoção no meio da noite e as pessoas têm o direito de serem informadas – de conhecer e participar do projeto. E o mais importante: uma remoção nunca pode deixar uma família sem teto”.

Audiência Pública

No dia 20 de maio, a equipe da Relatoria pelo Direito à Cidade realizou na sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), no Rio de Janeiro, uma audiência pública com o propósito de reunir poder público, terceiro setor e sociedade civil para discutir os impactos da realização dos mega-eventos a partir das intervenções urbanas, sobretudo nos casos de despejos e remoções forçadas.

Estiveram presentes 20 comunidades que denunciaram a falta de transparência por parte dos órgãos públicos, já que não têm acesso às informações sobre os projetos e nem direito de participar das decisões sobre as áreas onde moram. Representantes do poder público não participaram da audiência, mas o secretário municipal de Habitação, Jorge Bittar, firmou compromissos com a Plataforma Dhesca a fim de solucionar os conflitos. “A Secretaria Municipal de Habitação demonstrou abertura para discutir todos os casos visitados, abrindo um canal de diálogo em torno desses problemas. Dentre as ações firmadas estão a) imediata criação de espaço de mediação de conflitos; b) compromisso de discutir os projetos da Prefeitura com as comunidades”, afirmou o relator Orlando Júnior.

Veja o que o Observatório já publicou sobre o assunto:

Entrevista da Relatora Especial da ONU para a Moradia Adequada, Raquel Rolnik (e-metropolis nº 5)

Artigo “Desafios no Caminho para o Rio 2016”, do pesquisador Erick Omena, sobre o legado do Pan. (e-metropolis nº 4)