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De 28 a 31 de julho, o INCT Observatório das Metrópoles promoveu o Seminário Nacional da rede, no Rio de Janeiro. O evento reuniu cerca de 100 integrantes dos 21 Núcleos Regionais de todo o Brasil, com o objetivo de construir o referencial teórico para o novo programa de pesquisa 2025-2030, intitulado Transformações da Ordem Urbana e Estratégias de Desenvolvimento Urbano Inclusivo, Igualitário, Democrático e Ambientalmente Sustentável.

No dia 29, foi realizada a segunda mesa-redonda do evento, que analisou “As metrópoles na nova ordem urbano-regional: demografia, indústria e logística”. Os expositores foram os representantes do Núcleo Rio de Janeiro, Marcelo Ribeiro; do Núcleo Norte Fluminense, Érica Tavares; e o pesquisador Aldo Garcia Júnior, da UNICAMP. A coordenação da mesa ficou por conta da pesquisadora do Núcleo Rio de Janeiro, Regina Tunes, e a debatedora foi a pesquisadora do Núcleo São Paulo, Sandra Lencioni (USP).

Logo no início da mesa, Regina Tunes provocou os participantes com a pergunta-chave do novo programa de pesquisa do Observatório: como serão as nossas metrópoles no amanhã? Segundo ela, pensar as “metrópoles do amanhã” hoje, e a partir das dinâmicas latino-americanas, requer fugir do globalismo teórico. “Isso é central para as análises, oferecer entendimento sobre as transformações em curso. E nesta mesa se reconhece a relevância do entendimento das distintas formas que a dinâmica metropolitana se apresenta hoje, compreendendo as novas formas de dependência marcadas pelo rentismo e pelo padrão neoextrativista”, salientou.

O primeiro expositor da mesa foi o pesquisador Aldo Garcia Júnior (UNICAMP), que abordou a ligação entre logística, rentismo e neoliberalismo, e como esses processos atravessam as periferias metropolitanas. Ele falou sobre condomínios de galpões logísticos, onde os principais ocupantes são empresas de varejo (plataformas digitais/e-commerce) e operadores logísticos. Segundo ele, no contexto da pesquisa, galpões e infraestrutura estão junto com áreas degradadas e precariedade. “O conceito de urbanização extensiva dependente expressa a essência do fenômeno estudado: uma forma urbana moldada pela racionalidade logística e pela acumulação rentista nas periferias das metrópoles brasileiras, abrindo novas frentes de exploração”, observou.

Marcelo Ribeiro foi o segundo expositor da mesa e abordou a desindustrialização nas metrópoles brasileiras. Ele a definiu como a redução da participação do valor adicionado da indústria de transformação no PIB e a redução da participação do emprego industrial no total de empregos. Ribeiro atualizou dados da produção industrial brasileira e observou que “São Paulo, seguida de Salvador e Curitiba, foi a metrópole que mais contribuiu para o processo de redução da participação no valor de transformação industrial (VTI) metropolitano. A desindustrialização é um fenômeno metropolitano e acontece nos ramos de mais elevada intensidade tecnológica, mas há um comportamento heterogêneo entre as metrópoles”.

Érica Tavares, representante do Núcleo Norte Fluminense, falou sobre as dinâmicas da urbanização e mudanças demográficas no Brasil. De acordo com ela, as reflexões que vêm surgindo no campo da demografia e do urbano-regional estão ligadas às tendências de redistribuição populacional em uma economia periférica, dependente e extrativista. “Outra leitura seria a ideia de uma saturação das áreas urbanas, principalmente das regiões metropolitanas, com insegurança, criminalidade e questões climáticas. E uma muito própria da demografia é o aprofundamento da transição demográfica que vai ter distinções entre as aglomerações”, pontuou.

Sobre o Censo 2022, Tavares mencionou a redução acelerada da taxa de fecundidade: “Saiu de 6,2 (1960) para 1,55 (2022) filhos por mulher. É uma taxa menor que a das mulheres americanas e francesas. Menos filhos por mulher e mais tarde, com aumento de mulheres que terminam o ciclo reprodutivo sem ter filhos, e isso acontece mais intensamente nas metrópoles”. Ela pontua que um dos fatores relacionados com essa redução é o nível de escolaridade das mulheres, cada vez mais elevado. Sobre as concentrações urbanas que mais crescem, destacou Parauapebas (PA), Sinop (MT) e Itajaí/Balneário Camboriú (SC). Tavares constatou a permanência de uma relação entre transição urbana e demográfica, com um mercado de trabalho mais escolarizado, envelhecido e feminino.

A debatedora Sandra Lencioni levantou questões sobre as apresentações. “No âmbito de nossa cultura política, quais caminhos teriam o potencial efetivo de orientar estratégias de desenvolvimento urbano que poderiam fazer face ao patrimonialismo? Ou, como pensar esses caminhos no âmbito de nossa cultura política que é autoritária, conservadora e antidemocrática?”, indagou. Sobre a fala de Érica Tavares, Lencioni observou que estamos diante de um novo regime demográfico. “Cidades do agronegócio e mineração têm apresentado grande crescimento demográfico. É importante analisar a dinâmica da população, enfatizando o contexto regional ao qual a cidade se insere. Investigar a relação entre cidade e região para se compreender a dinâmica populacional”, sugeriu.

Mesa 2 “As metrópoles na nova ordem urbano-regional: demografia, indústria e logística”. Foto: Karina Soares.

Terceira mesa reuniu mulheres que debateram agronegócio, mineração e porto

A terceira mesa-redonda do seminário teve como título “As dinâmicas territoriais da nova ordem urbano-regional: agronegócio, mineração e porto”. Cinco mulheres foram as responsáveis por debater o tema proposto: como expositoras, as pesquisadoras Denise Elias (Núcleo Fortaleza), Tânia Diniz (Núcleo Baixada Santista) e Júnia Ferrari (Núcleo Belo Horizonte). A coordenação foi da pesquisadora do Núcleo Belo Horizonte, Jupira Mendonça, e a debatedora foi Lívia Miranda (Núcleo Paraíba).

A primeira apresentação foi de Denise Elias, que abordou o tema “Agronegócio e urbanização dependente no Brasil”, capítulo do livro A nova urbanização dependente no capitalismo rentista-neoextrativista. Segundo ela, o agronegócio se alicerça tanto em formas tradicionais quanto em novas formas de apropriação privada da natureza. Como objeto principal de análise, estão os temas e processos que formam as chamadas cidades do agronegócio. Para o desenvolvimento do capítulo, ela se baseou em pesquisas realizadas nas últimas décadas sobre a reestruturação produtiva da agropecuária brasileira, a difusão do agronegócio e o incremento da urbanização corporativa. “Importante dizer que isso não significa expor os resultados individuais de tais pesquisas, mas buscar apresentar reflexões de síntese à luz das mesmas”, observou.

Júnia Ferrari apresentou a pesquisa “Neoextrativismo mineral e desenvolvimento: uma unidade contraditória”, em coautoria com Renato Fontes. Segundo Ferrari, a pesquisa aborda o modelo de mineração intensivista no Quadrilátero Ferrífero, em Minas Gerais, onde o extrativismo mineral se manifesta como uma unidade contraditória: por um lado, gera arrecadação fiscal — ainda que incipiente — e, por outro, impõe riscos, danos ambientais e perda de soberania. O estudo foi realizado em sete municípios do vetor sudeste da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH): Brumadinho, Caeté, Itatiaiuçu, Nova Lima, Raposos, Rio Acima e Sabará, todos com forte dependência da atividade minerária.

A última apresentação da mesa foi de Tânia Diniz, que abordou o tema “Cidades portuárias em tempos de urbanização logística: o caso de Santos”. Segundo ela, o Porto de Santos abrange oito municípios e a região concentra a maior orla de palafitas do país. “Essas palafitas avançam sobre o rio Bugres e as condições de vida, trabalho e subsistência são as piores possíveis. A maior parte da população que mora lá é negra”, relatou. Diniz destacou a separação entre porto e cidade: com a introdução dos contêineres e a industrialização, houve demanda por galpões em áreas próximas ao porto, criando uma barreira entre áreas precárias e os setores valorizados da cidade. “É uma organização intencional que impede que a população de classe média e média alta vivencie o porto. Ou seja, o porto está longe da cidade”, afirmou.

Ao final, a debatedora Lívia Miranda destacou o acúmulo de reflexões trazido pelas expositoras. Para ela, construir uma nova agenda exige enfrentar a desregulamentação frente ao rentismo e ao extrativismo, e compreender os diferentes sujeitos e agentes em ação. “Quais são as mobilizações, incidências e pressões políticas possíveis no campo progressista e dentro dessa agenda? Se de um lado se fala em fragmentação, por outro lado se fala de forte afirmação. Cada grupo tem sua própria agenda e teria que ver como se dialoga com as forças de identidade desses grupos. Como enfrentar a reprimarização que estrutura a rede urbana brasileira?”, provocou.

Mesa 3 “As dinâmicas territoriais da nova ordem urbano-regional: agronegócio, mineração e porto”. Foto: Karina Soares.

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