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Qual o papel do componente habitacional nas recentes experiências de revalorização de áreas urbanas centrais no país? Neste artigo, destaque da Revista Cadernos Metrópole nº 34, João Carlos Carvalhaes Monteiro analisa a questão a partir da produção habitacional de interesse social na cidade do Rio de Janeiro. As reflexões são apoiadas na análise do Programa Novas Alternativos, criado em 1996 pelo poder público municipal.

O artigo “Habitação de interesse social em cenários de revalorização urbana: considerações a partir da experiência carioca”, de João Carlos Carvalhaes dos Santos Monteiro, integra a Revista Cadernos Metrópole nº 34, que traz como destaque o dossiê “As metrópoles, coesão social, conhecimento e inovação: o desafio do desenvolvimento nacional”.

Abstract
This article aims at contributing to the academic debate on the incorporation of the housing component into recent experiences of revalorization of urban downtown areas in Brazil. It presents the results found by a study about the production of social housing in downtown Rio de Janeiro. The reflections presented here derive from an analysis of a program called Novas Alternativas (New Alternatives), created in 1996 by the local government with the declared objective of encouraging home building in the central neighborhoods of Rio de Janeiro’s capital city. Through a review of the municipal government’s institutional publications about the theme and interviews with the program’s staff, this article uncovers the discursive components that support the actions of Rio de Janeiro’s local government in promoting the construction of home building.

Introdução

Por João Carlos Carvalhaes

Após décadas de abandono por parte dos poderes públicos e de desinvestimento do capital imobiliário, as áreas centrais de inúmeras cidades brasileiras vêm passando por uma gradativa revalorização simbólica e econômica, fenômeno apoiado na ampliação de um discurso oficial que evoca a necessidade de reverter supostos processos de “degradação” identificados nesses espaços. A “revitalização” tornou-se um imperativo nos programas de governo de diferentes siglas partidárias, atravessando mandatos e afirmando-se como uma responsabilidade incontornável das gestões públicas. Nesse contexto, inúmeros planos, programas e projetos vêm sendo apresentados por prefeituras, governos estaduais e esfera federal comprometidos com a reversão do que se convencionou chamar “crise” dos centros urbanos.

Em muitos casos, as estratégias apresentadas nesses documentos estão respaldadas por exemplos internacionais supostamente bem-sucedidos e baseiam-se num discurso que entende a revalorização dos centros como peça-chave para o desenvolvimento social e econômico à escala urbana e mesmo metropolitana. O imperativo da revitalização, fundamentado em críticas à ociosidade da infraestrutura instalada, à monofuncionalização e à degradação do espaço público, vem a reboque de um questionamento mais amplo das realizações do urbanismo modernista.

Dentre os princípios que regem os receituários de revitalização, destacam-se frequentemente propostas baseadas na valorização do patrimônio edificado, na reanimação cultural, no incentivo à mistura de usos e, em muitos casos, no estancamento de processos de esvaziamento populacional e na retomada do crescimento demográfico dos centros urbanos.

Constata-se que, se em alguns desses projetos a questão habitacional é alijada, em outros o debate ganha destaque como elemento estruturador para desencadear a almejada “revitalização”. Nesse último caso, o poder público exerce um papel fundamental, seja por meio do investimento direto em produção habitacional de interesse social, seja por meio da criação de condições facilitadoras para a atuação do capital imobiliário – tais como a flexibilização de normas urbanísticas, o rezoneamento e obras de reurbanização do espaço público.

De uma forma ou de outra, a defesa do adensamento populacional dos centros urbanos ganha amplitude, sendo festejado pela grande mídia, apoiado por setores da academia e reivindicado por movimentos sociais. Especialistas defendem as “cidades compactas” como um novo modelo de urbanização sustentável, no qual os centros adensados teriam papel fundamental para a diminuição do espraiamento urbano e de todas as consequências nefastas desse processo (Hillman, 1996).

Entre os urbanistas inspirados na retórica internacional de mixité sociale, as áreas centrais são concebidas como espaços privilegiados para a promoção da integração de diferentes classes sociais e da reversão dos atuais padrões de segregação urbana. Para o capital imobiliário, os centros tornam-se uma nova fronteira urbana a ser conquistada, com grande potencial de lucratividade por meio da renda diferencial gerada (Smith, 1996). No âmbito dos movimentos de luta pela moradia, a permanência de populações de baixa renda em áreas centrais surge como uma das principais bandeiras de um projeto utópico de cidade democrática.

É nesse contexto que o presente artigo tem por objetivo contribuir para o debate em torno da incorporação do elemento habitacional nas recentes experiências de revalorização de áreas urbanas centrais brasileiras. São apresentadas as conclusões obtidas a partir de uma pesquisa sobre a produção habitacional de interesse social na área central do Rio de Janeiro.

As reflexões expostas são apoiadas numa análise do Programa Novas Alternativas, criado em 1996 pelo poder público municipal com o objetivo declarado de fomentar a produção habitacional nos bairros centrais da capital fluminense. A partir de uma revisão das publicações institucionais da Prefeitura sobre o tema e de entrevistas com o quadro técnico que compõe o programa, buscou-se desvendar os componentes discursivos que embasam as ações do poder público municipal carioca em sua prática de fomento à produção habitacional. Entrevistas com os moradores contemplados com unidades habitacionais do programa complementam o debate, revelando pontos negligenciados ou ocultos no discurso oficial.

O artigo está dividido em três partes. Primeiramente, realizou-se uma breve descrição do fenômeno de revalorização da área central do Rio de Janeiro. Partiu-se de uma perspectiva histórica que contempla o período de recrudescimento dos processos de esvaziamento populacional e desinteresse do capital imobiliário até o momento presente, em que se observa uma retomada de investimentos privados e a criação do projeto de “revitalização” da antiga zona portuária, denominada operação urbana Porto Maravilha.

A segunda parte do artigo relata a incorporação do componente habitacional por diferentes propostas de intervenção em centros urbanos, abordando as experiências pioneiras do Banco Nacional de Habitação no final dos anos 1970 e sua captura por movimentos de luta pela reforma urbana e moradia a partir da década de 1980. Ao final, discute-se a experiência carioca de fomento à habitação de interesse social nos bairros centrais da cidade, questionando a compatibilidade entre o processo de revalorização urbana em curso e a possibilidade de reversão dos atuais padrões de segregação espacial.

Acesse o artigo completo na edição nº 34 da Revista Cadernos Metrópole.

Última modificação em 19-01-2016 23:02:29