Skip to main content

A Revista eletrônica e-metropolis oferece ao público brasileiro, na sua edição nº 19, a tradução inédita do artigo “Theses on Urbanization”, do professor norte-americano Neil Brenner, coordenador do Urban Theory Lab, da Harvard Graduate of Design e um dos principais estudiosos das questões urbanas na atualidade. Publicado originalmente na revista Public Culture e aqui traduzido por Daphne Costa Besen sob o título de “Teses sobre Urbanização”, o artigo traz uma contribuição crítica sobre a problemática contemporânea da urbanização planetária. Trata-se de uma importante síntese das reflexões teóricas, conceituais e metodológicas de Brenner sobre as questões urbanas, que certamente trará contribuições para os estudos sobre o urbano contemporâneo no Brasil e na América Latina.

O INCT Observatório das Metrópoles vem realizando várias ações de cooperação internacional com foco no debate sobre o tema metropolitano. Uma dessas parcerias tem sido com o Urban Theory Lab (http://urbantheorylab.net), coordenado pelo profº Neil Brenner na Harvard Graduate of Design (GSD/EUA), que tem um papel relevante para o pensamento crítico em relação aos processos capitalistas de urbanização com foco na construção de uma nova Teoria Urbana mundial.

Em outubro de 2014, a equipe do Observatório publicou a resenha do livro “Implosions/Explosions: Towards a Study of Planetary Urbanization”, escrita pela pesquisadora Daphne Costa Besen, com o intuito de divulgar no Brasil os estudos internacionais focados na construção de uma nova teoria urbana mundial.

Agora dando continuidade ao diálogo com o Urban Theory Lab e o pensamento crítico de Neil Brenner, a Rede Nacional INCT Observatório das Metrópoles oferece a tradução inédita do artigo “Theses on Urbanization”, que como afirma o próprio Brenner apresenta “uma série de teses destinadas a promover um debate sobre a condição urbana contemporânea no planeta, o estado de nosso patrimônio intelectual nos campos acadêmicos dedicados a sua investigação e as perspectivas para a adoção de novas estratégias conceituais, capazes de decifrar as realidades e as potencialidades urbanas emergentes em diversos lugares, territórios e escalas”.

A urbanização ultrapassou as fronteiras sócio-espaciais, não somente entre cidade e interior, urbano e rural, centro e periferia, mas também entre escalas urbanas, regionais, nacionais e globais. Partindo da hipótese radical de Henri Lefebvre da urbanização completa da sociedade, o pensamento crítico de Neil Brenner tem buscado constituir um novo modelo de urbanização, orientado para a re-apropriação coletiva e autogestão democrática do espaço planetário como trabalho da espécie humana.

O artigo “Teses sobre a urbanização” é mais uma etapa desse propósito de pensar o planeta terra no contexto de um novo tempo chamado de “Era Urbana”. Para Michael Hardt e Antonio Negri, por exemplo, “a metrópole contemporânea se converteu em um ponto de mobilização sociopolítica, cujo papel é análogo ao que desempenhou a fábrica durante a época industrial”. São nas grandes cidades também que a noção de direito à cidade (desenvolvida no final da década de 1960 por Henri Lefebvre) se transformou em um grito de combate para os movimentos sociais. É, pois, na Cidade que se colocam todos os desafios para o nosso futuro. Somos uma sociedade urbana global e novos desafios ao conhecimento se colocam a partir de agora.

Acesse o artigo completo “Teses sobre Urbanização” na edição nº 19 da Revista e-metropolis.

 

Leia também:

RESENHA: “Implosions/Explosions: Towards a Study of Planetary Urbanization”

A Crise da Urbanização Planetária | David Harvey

 

Teses sobre a urbanização

Neil Brenner

Tradução: Daphne Costa Besen

Nota: Esse artigo foi construído a partir de muitos anos de debate e com o trabalho de colaboração em curso com Christian Schmid, da ETH de Zurich. O autor agradece Travis Bost e Nikos Katsikis, da Harvard Graduate School of Design, por sua ajuda com ideias e imagens. O Centro Weatherhead para Assuntos Internacionais da Universidade de Harvard deu apoio às pesquisas. Hillary Angelo, Eric Klinen- berg, Peter Marcuse, Margit Mayer, Jen Petersen, Xuefei Ren e David Wachsmuth forneceram feedback inestimável para as primeiras versões desse texto. Eles são, com certeza, absolvidos de responsabilidade por suas limitações restantes e pontos cegos.

No começo da década de 1970, um jovem sociólogo marxista chamado Manuel Castells (na época, exilado em Paris), iniciou sua intervenção, que logo se tornaria um clássico, A Questão Urbana, ao declarar seu “espanto” que debate a respeito dos “problemas urbanos” que estavam se tornando “um elemento essencial nas políticas de governos, nas preocupações da mídia de massa e, consequentemente, no dia-a-dia de grande parte da população” (1977 [1972]: 1). Para Castells, esse espanto surgiu da sua perspectiva marxista ortodoxa, que pressupunha que a preocupação pelas questões urbanas eram ideológicas. Acreditava que o verdadeiro motor da mudança social residia em outro lado, na ação da classe trabalhadora e a mobilização anti-imperialista. Sobre essa base, Castells procedeu a desconstruir aquilo que via como a “ideologia urbana” predominante sob o capitalismo gerencial do pós-guerra: sua teoria levava a sério a construção social do fenômeno urbano no discurso acadêmico e político, mas em última instância associava essas representações com processos supostamente fundacionais, relacionados com o capitalismo e o papel do estado na reprodução da força laboral.

Quatro décadas depois da intervenção clássica de Castells, o discurso sobre as questões urbanas presente na primeira parte do século XXI pode provocar facilmente um assombro similar: não porque marcara as operações do capitalismo mas porque se tornou uma das meta-narrativas dominantes, por meio da qual se interpreta (tanto em meios acadêmicos quanto na esfera pública) nossa atual situação planetária. Hoje, a educação interdisciplinar avançada nas ciências sociais, planejamento e desenho está florescendo nas principais universidades, e os temas urbanos estão sendo debatidos energeticamente por historiadores, críticos literários e outros experts da área de humanas. Da mesma maneira, os cientistas físicos e computacionais e ecologistas, contribuem para o desenvolvimento dos estudos urbanos por meio de suas explorações de informações baseadas em satélites, análises geo-referenciadas e tecnologias de sistemas de informação geográfica (sigla em inglês: GIS), que oferecem perspectivas mais diferenciadas sobre as geografias da urbanização (Potere e Schneider 2007; Gamba e Herold 2009; Angel 2011).

Alguns textos clássicos, como “Morte e vida das grandes cidades americanas” (1965) de Jane Jacobs e “Cidade de quartzo” (1991) de Mike Davis, seguem animando as discussões sobre urbanismo contemporâneo, e mais recente, livros populares sobre cidades, como “O triunfo da cidade” (2011) de Edward Glaeser, “Bem-vindos à revolução urbana” (2010) de Jeb Brugmann e “Quem é a sua cidade?” (2008) de Richard Florida, junto com documentários como “Urbanizado” (dir. Gary Hustwit; 2011) e “Megacidades” (dir. Michael Glawogger; 1998), são amplamente discutidos na esfera pública2 . A Exposição Universal de 2010, celebrada em Shangai sob o lema “Uma melhor cidade, uma melhor vida”, e grandes museus, exposições, e bienais de Nova York, Veneza, Christchurch e Hong Kong dedicam grande atenção às questões da cultura urbana, desenho e desenvolvimento (Seijdel 2009; Kroeber 2012; Madden, forthcoming).

O Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Urbanos (ONU-Habitat 1996) declarou o advento de uma “era urbana”, gerada pelo rápido crescimento da população mundial nas cidades. Essa visão urbano-cêntrica do atual momento geo-histórico se popularizou por meio de uma série de conferências temáticas desenvolvidas em algumas das principais metrópoles do mundo, que foram organizadas e financiadas mediante uma iniciativa conjunta da London School of Economics e o Deutsche Bank (Burdett e Sudjic 2006). Até os debates sobre as mudanças climáticas e o futuro da biosfera estão sendo conectados com assuntos sobre a urbanização. Agora se reconhece que o entorno construído do planeta – em efeito, a infraestrutura sócio-material da urbanização – contribui diretamente para estabelecer transformações transcendentais na atmosfera, os hábitos bióticos, as superfícies do uso da terra e as condições oceânicas, o que produz consequências a longo prazo para o metabolismo das formas de vida humana e não humanas (Luke 1997; Sayre 2010).

Essas reorientações intelectuais e culturais Essas reorientações intelectuais e culturais coincidem temporalmente com uma série de transformações espaciais, reposicionamentos institucionais e mobilizações sociais em larga escala, que têm intensificado o significado e a magnitude das condições urbanas.

 

Última modificação em 10-02-2015