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Mobilidade urbana: uma questão metropolitana

By 26/09/2012dezembro 12th, 2017Artigos Semanais

Mobilidade urbana: uma questão metropolitana

A mobilidade deve ser pensada, cada vez mais, a partir de um mercado de trabalho organizado na escala metropolitana, envolvendo milhares de deslocamentos diários entre os vários municípios. Segundo dados do Censo 2010, nas 12 principais metrópoles brasileiras, mais de 13 milhões de pessoas se deslocam diariamente entre os municípios, seja para trabalhar ou estudar. Metrópoles como São Paulo e Rio de Janeiro não suportam mais deslocamentos baseados predominantemente no automóvel individual. Diante desses números e em um contexto de período eleitoral, como superar os inúmeros problemas decorrentes da chamada “crise da mobilidade urbana” presente hoje na maioria das grandes cidades do país?

O artigo “Mobilidade urbana: uma questão metropolitana”, do pesquisador Juciano Martins Rodrigues, foi publicado no último sábado (22/09) na página especial “Eleições 2012”, do Jornal O Estado de São Paulo. O texto é mais um resultado da parceria INCT Observatório das Metrópoles e Estadão na cobertura das eleições municipais deste ano, cujo objetivo é promover o debate sobre os principais desafios para a gestão dos grandes centros urbanos.

Leia a seguir a coluna ““Mobilidade urbana: uma questão metropolitana”. O texto também pode ser acessado no site do Estadão online.

 

Mobilidade urbana: uma questão metropolitana

Juciano Martins Rodrigues, Observatório das Metrópoles

Nos últimos tempos, a questão da mobilidade urbana vem ocupando cada vez mais espaço no debate público no Brasil. Uma pesquisa realizada recentemente perguntou ao paulistano o que falaria caso ficasse cara a cara com um candidato a prefeito por cinco minutos. Para nada menos que 40% o assunto seria transporte. Outra pesquisa revelou que 80% consideram o trânsito ruim ou péssimo.

Definitivamente, o assunto está na boca do povo, afinal, é ele quem mais sofre com os problemas decorrentes da crescente precariedade das condições de deslocamento nas cidades – o que nos permite falar, inclusive, em uma “crise da mobilidade urbana”. Na última década, em dez das principais metrópoles do país, enquanto o número de automóveis aumentou 60%, a quantidade de pessoas que levam mais de uma hora no percurso casa-trabalho aumentou de 15,5% para 17,2%. Nesse mesmo período, por exemplo, o número de motocicletas aumentou 10 vezes em Belém, e em São Paulo elas passaram de 400 mil para 1,4 milhão. Mais veículos, mais poluição, mais tempo no trânsito, mais acidentes.

No atual período eleitoral, o debate público sobre a questão da mobilidade urbana no Brasil toma outra relevância e, como era de se esperar, o assunto aparece nos discursos e nas promessas dos candidatos. Na maioria das vezes, o problema da mobilidade é visto apenas como um problema de trânsito. Como se para resolver o problema dos congestionamentos não fosse necessário superar outros gargalos do modelo de transporte, e a mobilidade não estivesse relacionada a outros aspectos da vida urbana, como acesso ao emprego, ao estudo e ao lazer.

Da maneira como o tema vem sendo tratado, perde-se a oportunidade de discutir essa crise sob uma perspectiva mais ampla, que considere o cidadão a partir de suas experiências cotidianas como pedestres, ciclistas, usuários do transporte público, motociclistas e motorista. Pelo contrário, quando as propostas não são mirabolantes, candidatos reproduzem discursos vagos ou voltados para uma clientela eleitoral restrita. É o caso, por exemplo, de um candidato a vereador cuja bandeira é o aumento no número de vagas de estacionamento para motos no centro de uma metrópole.

No cenário atual, e para o futuro que se desenha, dois dados são indispensáveis. Em primeiro lugar, estão previstos, no contexto dos megaeventos, os maiores volumes de investimentos em projetos de mobilidade urbana da história do país, levando-nos a supor que há perspectivas de superação desta crise. No caso da Copa do Mundo, prevê-se mais de R$ 12 bilhões na implantação de projetos no campo da mobilidade – o que representa quase 50% do total a ser investido. Em segundo lugar, temos uma lei recentemente aprovada que estabelece as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana e recomenda, entre outras coisas, a priorização do transporte público coletivo, e o não-motorizado sobre o individual motorizado.

Neste contexto, é preciso reconhecer a metrópole como um território cujas fronteiras políticas das autoridades locais (municípios) não coincidem com a estrutura funcional e econômica da mancha urbana, que extrapola essas fronteiras. A fragmentação política, onde cada gestor municipal defende seus próprios interesses, está por trás da questão metropolitana que nos coloca frente ao desafio de como planejar e financiar infraestruturas nessas áreas, inclusive as de transporte.

A mobilidade deve ser pensada a partir de um mercado de trabalho organizado na escala metropolitana, envolvendo milhares de deslocamentos diários entre os vários municípios. Segundo dados do Censo 2010, nas 12 principais metrópoles, mais de 13 milhões de pessoas se deslocam diariamente entre os municípios, seja para trabalhar ou estudar.

Metrópoles como São Paulo e Rio de Janeiro não suportam mais deslocamentos baseados predominantemente no automóvel individual. Discutir seriamente a superação da crise da mobilidade começa por questionar este modelo. Neste caso, admitem-se, inclusive, medidas restritivas ao seu uso, como a adoção de pedágios urbanos. A nova lei da mobilidade cria respaldos jurídicos para isso. A solução, porém, pode estar no planejamento das cidades, com a ocupação dos vazios urbanos, o adensamento das áreas centrais ou a revalorização do transporte ferroviário. Por fim, é preciso reforçar que, mais do que uma questão eleitoral (ou eleitoreira), a mobilidade urbana deve ser tratada como uma questão metropolitana.

Juciano Martins Rodrigues

Doutor em Urbanismo e pesquisador do INCT Observatório das Metrópoles, Núcleo Rio de Janeiro.