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Quais os obstáculos para a efetivação de um sistema de governança metropolitana no Brasil? Diante de contexto de eleições legislativas em todo o país em 2018, o INCT Observatório das Metrópoles divulga os resultados da tese “Representação política e governança na Região Metropolitana de São Paulo”, da pesquisadora Frederica Valle de Queiroz Padilha, que tem como objetivo identificar e analisar os mecanismos que fazem com que a dinâmica política de representação se traduza em obstáculos para a construção de um sistema de governança e para a mobilização dos atores políticos em torno de uma agenda metropolitana.

O trabalho integra um grupo de pesquisas do Observatório das Metrópoles sobre o tema da geografia do voto, e aponta que, no caso da RM de São Paulo, o avanço das questões metropolitanas parece estar relacionado com o componente partidário, representado pela disputa política entre os dois maiores partidos do estado (PSDB e PT) e onde a falta de capacidade do legislativo de pautar a agenda política também aparece como um obstáculo para o avanço das questões metropolitanas na assembleia.

A tese “Representação política e governança na Região Metropolitana de São Paulo” foi defendida no Curso de Doutorado do Programa de Pós-Graduação em Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPPUR/UFRJ), e contou com a orientação do Prof. Dr. Luiz César De Queiroz Ribeiro; e Coorientador o Prof. Dr. Nelson Rojas de Carvalho. Desse modo, o trabalho é mais um resultado da Rede INCT Observatório das Metrópoles.

Segundo Frederica Valle de Queiroz Padilha, a partir do recorte empírico da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), a primeira parte da pesquisa investiga a evolução do processo de governança metropolitana no Estado de São Paulo, identificando a participação dos diferentes atores políticos neste processo, em especial os atores do legislativo estadual.

A segunda parte analisa alguns aspectos do sistema de representação política no Brasil, já identificados em outros estudos como obstáculos para a efetivação de um sistema de governança metropolitana: o déficit de representantes metropolitanos nas assembleias legislativas, o comportamento político das metrópoles e o padrão geográfico de votação dos deputados.

Por fim, a atividade legislativa dos deputados é investigada, a fim de se verificar a presença de temas metropolitanos na agenda política e como estes temas se associam a uma lógica mais paroquialista ou universalista, aos padrões geográficos de votação e aos partidos políticos dos deputados.

OBSTÁCULOS PARA A GOVERNANÇA METROPOLITANA

O trabalho de Frederica Padilha mostra que os obstáculos à cooperação metropolitana de ordem fiscal e institucional parecem ter se acentuado a partir da Constituição de 1988, que surgiu com uma concepção municipalista, onde a questão metropolitana não era vista como uma prioridade.

Nesse sentido, os arranjos políticos e territoriais passaram a privilegiar a escala estadual e municipal, de modo que a escala metropolitana aparece como mais um ente de gestão governamental, sobrepondo-se ou superpondo-se aos já existentes. Ou seja, dar uma base política, administrativa e financeira às metrópoles por vezes é encarado como uma concorrência por recursos públicos e mesmo como uma ameaça a autoridade dos governos municipais e estaduais sobre seus territórios.

Outro ponto de destaque aponta que na nova constituição, a criação e a gestão das regiões metropolitanas passaram a ser de responsabilidade dos estados por meio de suas assembleias legislativas, onde deveriam ser discutidas e regulamentadas as propostas de gestão de problemas metropolitanos com uma base jurídica sólida, legitimidade-político social e baseadas em arranjos institucionais de cooperação intermunicipal sustentáveis no longo prazo.

De acordo com Frederica Padilha, este novo contexto fez com que muitos estudos se voltassem para o sistema de representação política no Brasil para identificar outra ordem de obstáculos ao enfrentamento das questões metropolitanas.

É nesta dinâmica político-eleitoral que Carvalho e Ribeiro (2013) identificam alguns obstáculos para que as discussões sobre a solução de problemas metropolitanos prospere.

“Considerando que os deputados estaduais de base eleitoral na metrópole seriam os representantes políticos legítimos dos interesses metropolitanos, o primeiro obstáculo apontado pelos autores seria o déficit de representantes metropolitanos no Congresso e nas assembleias legislativas. Os autores ressaltam ainda que este fator se agrava uma vez que os representantes metropolitanos tendem a obter a maioria de seus votos em apenas um município e por esta razão acabam se voltando à assuntos locais e paroquiais em detrimento de temas que viabilizassem um programa metropolitano com foco na resolução de problemas comuns, gerando o que Carvalho chamou de paroquialismo metropolitano”, explica a pesquisadora.

O segundo obstáculo refere-se ao comportamento político das metrópoles, que seria regulado por gramáticas políticas distintas, onde a periferia metropolitana seria marcada pela gramática do clientelismo, como uma combinação de participação eleitoral elevada e do voto personalizado enquanto a capital seria marcada por uma gramática dupla de pouca participação eleitoral com uma participação mais politizada.

Esta gramática dupla se daria em função de fatores ligados à dinâmica de fragmentação social dessas áreas que impedem as regiões metropolitanas de construir uma identidade política dentro de um sistema de representação, como argumentam os autores:

“As cidades são territórios marcados por dinâmicas de fragmentação social, cultural e territorial que bloqueiam a emergência das instituições necessárias para sua transformação em comunidades políticas. (CARVALHO E RIBEIRO, 2013, p.296, tradução nossa)

Dentro deste contexto, o objetivo desta pesquisa é identificar e analisar os mecanismos que fazem com que a dinâmica política de representação se traduza em obstáculos para a construção de um sistema de governança e para a mobilização dos atores políticos em torno de uma agenda metropolitana”, afirma a pesquisadora e completa:

“Uma das razões para a não efetividade das políticas metropolitanas parece residir no fato de que, ainda que a preocupação com as questões regionais e metropolitanas esteja presente no aparato técnico do estado paulista, na dimensão governamental outras racionalidades entram em funcionamento, em combinação ou mesmo em contradição com a racionalidade burocrática técnica”.

A pesquisa aponta ainda que na questão da representação política e na dinâmica político-eleitoral, a preocupação com questões regionais e metropolitanas não parece estar presente, impedindo a efetivação de planos e projetos mais explícitos e de longo prazo, uma vez que estes planos preveem uma repartição de recursos em uma dinâmica que é bloqueadora da dinâmica da cooptação e do clientelismo. A definição da alocação de recursos por razões puramente técnicas em torno de questões territoriais vai de encontro a dinâmica política

Neste caso, São Paulo estaria repetindo o que tem se verificado em outros estados: a dinâmica político-eleitoral não mobiliza os atores do sistema políticos em torno da problemática regional e metropolitana, como se houvesse uma dissonância entre a dinâmica racional técnica do governo e a dinâmica política de representação.

Leia, no link a seguir, o trabalho completoRepresentação política e governança na Região Metropolitana de São Paulo.