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O projeto “Risco e Sustentabilidade nas Metrópoles Brasileiras”, do INCT Observatório das Metrópoles, identificou enorme precariedade dos municípios metropolitanos em elaborar e disponibilizar à sociedade informações espaciais que auxiliem na construção de estratégias territoriais para mitigação dos efeitos das mudanças climáticas. Uma consequência direta disso é o comprometimento dos espaços de debate e reflexão sobre políticas efetivas de prevenção ao risco ambiental, já que esses dados poderiam mostrar objetivamente quais áreas deveriam ser priorizadas e quais os principais fatores que influenciam no risco.

Buscando contribuir para o debate público acerca das questões climáticas na cidade, o objetivo do projeto, coordenado pelas pesquisadoras Thêmis Aragão (UFRJ) e Ana Lúcia Britto (UFRJ), foi apresentar um quadro das condições ambientais das metrópoles brasileiras, além de subsidiar a elaboração de estratégias e ações para a mitigação de riscos ambientais relacionados às mudanças climáticas para setores públicos e privados. A princípio, o projeto de pesquisa considerou montar um indicador composto para medir a susceptibilidade ao risco ambiental. Porém, ao longo da coleta de dados para consolidar esse índice, observou-se que importantes variáveis consideradas no estudo não estavam sendo disponibilizadas por considerável parte dos municípios pesquisados. Dados sobre localização de abrigos, sua capacidade e condições físicas, o local dos equipamentos de apoio em caso de desastre ambiental, assim como informações que auxiliem na caracterização da população vulnerável não tem sido sistematizados e divulgados à população.

Para além da identificação das áreas com maior susceptibilidade a eventos climáticos, o plano de trabalho incluía a elaboração de um índice de sustentabilidade ambiental, na perspectiva de observar quais os potenciais de redução de emissões a partir de políticas urbanas. Para este índice, a rede do Observatório das Metrópoles buscou coletar dados referente às políticas de mobilidade, a distribuição dos equipamentos sociais no território, assim como a localização das áreas verdes e de lazer. Essas informações contribuem para a construção de estratégias e projetos urbanos que fortaleçam a implantação de um urbanismo baseado na natureza ou de infraestruturas verdes, mitigando risco à vida e econômicos, além de proporcionar ambientes urbanos saudáveis. A identificação das áreas vegetadas e passíveis de recuperação no ambiente urbano permite a estruturação de planos de arborização que vai lidar de forma mais eficiente com fenômenos de ilhas de calor, de diminuição velocidade das águas em enxurradas e de redução do escoamento superficial, que contribui com as inundações.

Uma terceira dimensão do estudo buscou espacializar as populações vulneráveis. Ao dar enfoque às questões de desigualdade socioterritorial, aspectos relacionados ao grau de exposição a epidemias, aos fatores de reprodução da desigualdade e a segurança da moradia se colocam como fatores relevantes na alocação de infraestrutura básica e estabelecimento de projetos sociais. Porém, esta dimensão de análise também tem sido prejudicada pelo atraso da aplicação e divulgação de dados do Censo 2022. “Este atraso causa impactos desastrosos nos processos de planejamento dos órgãos públicos, pois os municípios ficam desprovidos de informação atual que permita dimensionar e localizar as populações vulneráveis e dos espaços com precariedade de serviços públicos”, ressalta Aragão.

Estrutura do Índice de Sustentabilidade Ambiental, objetivo do projeto.

Municípios não têm capacidade para lidar com as emergências climáticas

Segundo a pesquisadora Thêmis Aragão, grande parte dos municípios que compõem as Regiões Metropolitanas estudadas têm apresentado indisponibilidade de banco de dados georreferenciados para, pelo menos, iniciar o debate sobre os territórios sujeitos a desastres naturais. Isto é, existe uma discrepância na capacidade institucional e administrativa dos municípios para dar suporte ao debate público sobre políticas urbanas voltadas aos efeitos das mudanças climáticas.

“Podemos afirmar que os municípios não têm capacidade para lidar com as emergências climáticas porque não possuem dados territorializados difundidos para gestores e população sobre risco ambiental nas cidades. Muitos não têm domínio do que acontece em seu próprio território. Grande parte dos dados precisos são produzidos por municípios polos das Regiões Metropolitanas, enquanto os municípios pequenos continuam sem eficácia em suas ações”, pontua Aragão.

Projeto contou com a participação de 12 núcleos da rede

O projeto contou com a participação direta de 12 Núcleos Regionais do Observatório das Metrópoles: Belém, Fortaleza, Natal, Campina Grande, Salvador, Vitória, Rio de Janeiro, Norte Fluminense (Campos dos Goytacazes), Belo Horizonte, São Paulo, Maringá e Porto Alegre. “De todas as regiões metropolitanas pesquisadas, apenas os municípios polos de São Paulo, Belo Horizonte, Vitória e Rio de Janeiro apresentaram dados territorializados com precisão e publicidade. Niterói foi um dos raros municípios que não é polo e que possuía uma robusta infraestrutura de divulgação de dados espaciais que poderiam ser usados para análises climáticas”, revela Aragão.

Para a pesquisadora, outro aspecto importante da análise das políticas climáticas para as metrópoles brasileiras diz respeito aos arranjos institucionais e políticos. É importante ressaltar que a questão climática não tem sido abordada de forma generalizada como uma questão metropolitana e sim, de âmbito municipal. Porém, inundações devem ser analisadas pela perspectiva de bacias hidrográficas e muitas delas abrangem mais de um município, o que demonstra a urgência de lidar com o risco ambiental na escala metropolitana. “Em termos institucionais, o debate se restringe a ações federais, estaduais e municipais, enquanto a metrópole, principal locus para esse tipo de planejamento, é invisibilizada na construção de políticas climáticas efetivas”, conclui Aragão.

Metrópoles analisadas no projeto.

No caso da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, a água que todos os anos inunda municípios como Belford Roxo e São João de Meriti é resultante das precipitações que ocorrem em Nova Iguaçu, Nilópoles, Mesquita e até em Bangu, na zona norte do Rio de Janeiro.

Já em Belo Horizonte, são duas as principais bacias: Pampulha-Onça e Arrudas, ambas afluentes do Rio das Velhas. No caso da bacia do Arrudas, as cabeceiras estão em Contagem e em porções da zona sul da capital mineira. As porções de jusante atravessam a cidade e deságuam em Sabará onde passa o Velhas. É a bacia mais adensada das duas, com enchentes nos seus principais afluentes e no principal Arrudas, localizado em área mais adensada da cidade. Na bacia do Pampulha-Onça, a lagoa exerce importante papel de controle de cheias, amortecendo os córregos que chegam nela e evitando, por exemplo, que o aeroporto alague.

Portal GEOMetrópoles será lançado em breve

O GEOMetrópoles é uma plataforma que pretende reunir dados espaciais e índices de risco e sustentabilidade. “Na construção desse índice e incorporação dos dados no GEOMetrópoles, percebemos a enorme discrepância de capacidade institucional entre os municípios brasileiros. Isso implicou na dificuldade de construir o índice, resultando apenas em dados espaciais”, ressalta Aragão. A identificação dos dados espaciais, as chamadas “variáveis de interesse do projeto”, vão desde aspectos físico-naturais – como limites das Bacias Hidrográficas, área de inundação, ventos, geadas, queimadas, erosividade das chuvas, erosão costeira – até aspectos do uso do solo – como as áreas de proteção ambiental, aglomerados urbanos – e aspectos da infraestrutura urbana – identificando os equipamentos de educação, saúde, áreas de lazer, estações de tratamento de água e esgoto, quartéis do Corpo de Bombeiros, entre outros. “É necessária uma reflexão crítica sobre a questão de um índice nacional, dada a complexidade territorial do país, com regiões que sofrem com seca e outras com geada, assim como ciclones em outras”, pontua Aragão.

Inicialmente, os dados disponibilizados pelo GEOMetrópoles vão incluir apenas as metrópoles pesquisadas pelo projeto. Contudo, em sua fase de operacionalização, serão adicionados dados de outras importantes Regiões Metropolitanas, como Florianópolis, Manaus, Cuiabá e Campinas.

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