Durante o XXI ENANPUR, em Curitiba, a Sessão Especial “Cidades democráticas, justas e sustentáveis: dilemas e perspectivas da Política Nacional de Desenvolvimento Urbano” reuniu pesquisadores e representantes do poder público para discutir os rumos da política urbana brasileira. A mesa foi composta por Orlando Alves dos Santos Junior, Rosana Denaldi, Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro, Myrian Cardoso e Yuri Giustina.
Um dos destaques da sessão foi a intervenção do coordenador do INCT Observatório das Metrópoles, Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro, que apresentou reflexões a partir do novo projeto de pesquisa da rede, aprovado no edital do CNPq. O pesquisador defendeu a necessidade de superar a atual ordem urbana-regional, marcada por um regime de acumulação rentista e neoextrativista, e propôs recolocar a política de desenvolvimento urbano como uma das alavancas da reconstrução do país.
“A cidade é, ao mesmo tempo, expressão das desigualdades brasileiras e mecanismo de sua reprodução. Retomar a política de desenvolvimento urbano exige confrontar o divórcio histórico entre a estrutura produtiva nacional e as necessidades das maiorias urbanas”, afirmou Luiz Cesar. Segundo ele, o capitalismo brasileiro atual exacerba traços antissociais, antinacionais e antidemocráticos, e qualquer estratégia de transformação deve se dar por meio de uma nova articulação entre desenvolvimento urbano e desenvolvimento nacional.
Inspirado na abordagem de “missões” proposta por Mariana Mazzucato, Luiz Cesar sugeriu que o urbano seja incorporado como uma das grandes missões do Estado brasileiro, articulando investimentos públicos, inovação tecnológica, inclusão social e sustentabilidade ambiental. “Transformar a cidade brasileira é condição para transformar o capitalismo rentista. E vice-versa”, resumiu, ao defender que a política urbana seja pensada como vetor de reindustrialização e ampliação do bem-estar social.
A sessão também contou com a participação de Yuri Giustina, da Secretaria Nacional de Desenvolvimento Urbano e Metropolitano, que apresentou o andamento da nova proposta da Política Nacional de Desenvolvimento Urbano (PNDU), incluindo a minuta de projeto de lei formulada pelo Ministério das Cidades. O processo, segundo ele, busca institucionalizar as relações entre os atores implicados no tema e está sendo debatido no Conselho das Cidades. Em breve, pretendem incorporar contribuições do ciclo de Conferências das Cidades.
Rosana Denaldi, coordenadora do Centro de Estudos da Favela (CEFAVELA), trouxe contribuições sobre o papel das favelas no desenvolvimento urbano e destacou que a urbanização de favelas, seja para prevenir ou remediar os problemas, está diretamente relacionada ao movimento de recuperação da cidade. Ela ressaltou a necessidade de fortalecer os instrumentos urbanísticos de forma a garantir a função social da propriedade, evitando sua captura por interesses econômicos. Já Myrian Cardoso, coordenadora da Clínica MultiverCidades da Amazônia, destacou os desafios fundiários em cidades amazônicas, onde leis informais e práticas clientelistas ainda predominam nos processos de regularização.
A Sessão Especial evidenciou que, diante dos dilemas contemporâneos – como o aprofundamento das desigualdades, a crise climática e os limites do modelo econômico vigente, pensar uma política nacional de desenvolvimento urbano exige articular justiça social, sustentabilidade ambiental e democracia. Nesse horizonte, a política urbana deixa de ser apenas um instrumento de ordenamento territorial e se torna parte de um projeto de transformação nacional.